(Credits: Courtesy Salone del Mobile.Milano / © DIEGO RAVIER)

Shigeru Ban em Milão: a arquitetura é para todos

Inaugurando o ciclo de palestras hospedado no Euroluce 2023, do Salão de Móveis de Milão, o arquiteto japonês cativou a plateia discorrendo sobre momentos-chave da sua carreira para, então, mostrar a sua inteligência criativa aplicada em projetos sociais.

Salone del Mobile.Milano (18 a 23 de abril de 2023, Milão – Itália)

 

Shigeru Ban abriu em 19 de abril o ciclo de palestras do espaço Arena do Euroluce / iSalone 2023, em Milão. No convidativo ambiente que funciona complementarmente como uma praça para o descanso e encontros dos visitantes da feira, o arquiteto fez uma emocionante retrospectiva da sua produção, abordando os temas da pesquisa de materiais e de tecnologias construtivas, alternativos, assim como o convívio das encomendas privadas com projetos assistenciais no seu escritório.

Acompanhado por imagens das suas icônicas criações, mas também de projetos de início de carreira, o arquiteto guiou os espectadores no vislumbre de questões que motivam a sua atuação, e cuja relevância e perspicácia no momento presente as tornam referência obrigatória no que diz respeito à urgência da arquitetura e do design contribuírem para a sustentabilidade da existência humana.

 

Shigeru Ban (Credits: Courtesy Salone del Mobile.Milano / © DIEGO RAVIER)

 

Alternativo, temporário, baixo custo, dignidade da vida cotidiana foram termos que perpassaram toda a fala do arquiteto, dando indícios aos já admiradores do seu trabalho, e aos porventura iniciantes no tema, do que torna tão interessante a sua prática. A seleção dos projetos e o discurso tiveram como pano de fundo a percepção de que, para Shigeru Ban, têm igual importância os vários tipos de projeto a que se dedica, independente das suas escalas ou naturezas.

 

Shigeru Ban (Credits: Courtesy Salone del Mobile.Milano / © DIEGO RAVIER)

 

A primeira imagem trazida pelo arquiteto, assim, foi de uma mostra que concebeu para apresentar a obra do seu “mestre”, nas suas próprias palavras, o arquiteto Alvar Aalto. Com orçamento restrito para conceber a cenografia, encontrou no papel – aplicado no teto – a possibilidade material de evocar a madeira presente na arquitetura e no design do finlandês. Depois, sucederam-se imagens sobre a evolução do uso do papel nos projetos de Shigeru Ban, passando de revestimento à de vedação e elemento auto-portante. Nisso, o arquiteto mencionou a importância de pensar na junção das peças a fim de aliar o alternativo ou artesanal ao industrial, possibilitando a adoção em larga escala das tecnologias que concebe em resposta aos desafios dos projetos. Particularmente interessante foi acompanhar a sua reinterpretação, arquitetônica, de técnicas ancestrais do trançado de filamentos. Sempre mais fácil, na construção, reduzir a dois o número de peças que se encontram nos nós ou junções dos sistemas.

Uma vez delineada a sua criatividade ligada às técnicas construtivas e à beleza dos projetos, Shigeru Ban passou à mostra de estruturas temporárias concebidas para acolher pessoas refugiadas ou atingidas por catástrofes naturais. Japão, Índia, Haiti, Turquia, Ucrânia: há décadas o arquiteto monitora e responde, com o seu trabalho, às necessidades essenciais do ser humano em situações extremas, fazendo a diferença no mundo com a sua inteligência criativa. Igualmente tocante foi ouvi-lo falar, durante a palestra e na pertinente sessão de perguntas e respostas conduzida por Yoko Choy (editora da revista Wallpaper, na China), não sobre os entraves – governamentais, financeiros, materiais – mas sobre os modos de efetivar os projetos sociais. Para isso, entre outros, Shigeru Ban costuma convocar estudantes e professores do Japão e das áreas atingidas.

 

Yoko Choy, editora da revista Wallpaper, na China (Credits: Courtesy Salone del Mobile.Milano / © DIEGO RAVIER)

 

Shigeru Ban fez a platéia rir e se emocionar com a sua apresentação. Annalisa Rosso, diretora editorial do Salone del Mobile e curadora do ciclo de palestras, analisa que Shigeru Ban mostrou ao público que “é possível fazer a diferença, trilhando caminhos inesperados e inovadores”. Para Annalisa, assim, “o trabalho de Shigeru Ban mudou a nossa perspectiva [da arquitetura]. É uma fonte de inspiração para a plateia de estudantes, projetistas, arquitetos, empresários, e o próprio salão. É preciso ampliarmos os nossos horizontes; estarmos abertos às contaminações – interdisciplinares”.

E se no futuro as mudanças climáticas fizerem de todos nós refugiados, que ao menos possamos contar com acolhimentos dignos, como aqueles criados por Shigeru Ban mundo afora.