Alberto Botti critíca paralisação do Complexo Cultural Luz

Governador Geraldo Alckmin justificou a interrupção do projeto em São Paulo por considerá-lo caro demais e com “cara de coisa para rico”

No dia 17 de março, o governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, anunciou a paralisação do Complexo Cultural Luz, projeto desenvolvido pelo renomado escritório suíço Herzog & De Meuron e que prometia revitalizar a região da Cracolândia, no centro da capital paulista.

Alckmin justificou a interrupção por considerar a obra cara demais e com “cara de coisa para rico”, de acordo com reportagem do jornal Folha de S. Paulo.

Alckmin paralisa projeto do Complexo Cultural Luz, em SP

Em carta aberta, o arquiteto Alberto Botti, sócio do escritório paulistano Botti Rubin Arquitetos, critica a decisão do governo estadual e afirma que os arquitetos brasileiros vivem “num submundo onde se dá pouquíssima importância a cultura e a valorização do espaço através a arquitetura”.

Confira abaixo o texto “Complexo Cultural da Luz e outras questões”, de Albereto Botti:

Complexo Cultural da Luz e outras questões

Fomos surpreendidos pelas noticias veiculadas nos maiores jornais de São Paulo, informando a “paralisação dos estudos” referente ao Complexo Cultural Luz.

A noticia informa que esta paralisação, embora não definitiva, parte da posição do Sr. Governador quanto ao “alcance elitista do projeto”; e mais, informar o custo do projeto de R$ 45 milhões para os arquitetos, além de R$ 8 milhões para consultoria especializada em teatros.

Estes valores, que aparecem como fantásticos para muitos, são apenas aqueles cobrados por expoentes internacionais no campo de arquitetura em todo o mundo; o que revela:

ou vivem eles em outra galáxia,

ou são os arquitetos brasileiros que vivem num submundo onde se dá pouquíssima importância a cultura e a valorização do espaço através a arquitetura.

Infelizmente, esta última opção é a verdadeira; e cabe dizer, puxando a fila deste triste estado de coisas, está o governo em todas suas instâncias.

De fato, a interpretação dada pelo governo a lei nº 8.666, acaba por estabelecer a concorrência de serviços pelo menor preço, como critério de definir profissional ou empresa de arquitetura efetuará um trabalho; ora, nem na aquisição de verduras numa feira livre, uma boa dona de casa renuncia a qualidade do produto como condição básica para sua aquisição, só depois vem o custo…

No entanto, é assim que os governos brasileiros escolhem os projetos que vão embasar a construção de toda gama de edifícios institucionais no país.

Isto, quando não apelam para uma estranha dicotomia, separando o projeto em duas partes, concepção e projeto executivo, uma divisão que só existe na cabeça dos burocratas; fossem eles Salomão, e a famosa sentença quanto a quem pertencia a criança disputada entre duas mulheres uma das quais a mãe, seria certamente pela divisão da criança ao meio!

Não, os arquitetos no estrangeiro não recebem remunerações fantásticas;

é o arquiteto brasileiro que vê seu trabalho aviltado, diminuído, mal remunerado sob o olhar complacente de uma sociedade que pretende defender seu patrimônio cultural, mas só entende sua valorização através a presença de profissionais de outros países;

Complexo de inferioridade cultural?

Ou uma boa dose de irresponsabilidade frente aos problemas desta nação, que parece ser, infelizmente, a tônica que vem enfrentando este país.

Deixamos de comentar o conceito quanto ao “alcance elitista do projeto”, lembrando apenas o dito, que às vezes a razão tem razões que a própria razão desconhece…
Alberto Botti
Arquiteto e Urbanista
19/03/2014″